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terça-feira, março 08, 2005

Os jovens e a morte nas estradas

Hoje, primeiro dia após difícil decisão de encetar a escrita utilizando uma caneta Mont Blanc, oferecida há já alguns anos, pelo primeiro grupo de alunos com quem tive a honra de partilhar saberes na Escola Europeia do Luxemburgo. Para eles vai o meu muito obrigado e os desejos de que o seu percurso neste mundo feroz seja repleto de coisas boas.
Foi preciso esperar até 2005 para me decidir a utilizá-la convenientemente. Que dizer dos arrepios que me percorrem a espinha neste preciso momento? Às vezes, a inspiração de momento é feita de pequenas coisas – como este processo de simplesmente ter a oportunidade de utilizar outro instrumento, que não o computador, para deixar escorrer para o papel palavras, tinta e borrões… Neste planeta conturbado e acelerado onde a tecnologia tomou conta de nossas vidas, voltar a escrever à mão é um privilégio (apesar de agora estar a utilizar o computador).
Ontem li um artigo-entrevista que me sensibilizou o bastante para deixar a tinta correr nestas folhas. É um tema dos nossos dias e ao qual poucas respostas têm sido apresentadas.
Jovens condutores que se mutilam, se matam nas nossas estradas. Correr como louco neste mundo desenfreado é, infelizmente, a tónica comum que se impõe.
Uma das expressões utilizada pelo psiquiatra Carlos Braz Saraiva, o entrevistado em questão, diz:
“A nossa sociedade promove a glorificação pelo risco.”
Sabemos que este tipo de pessoas, que nas estradas conduz como cavalos desenfreados, além de inconsciente e irresponsável é sinónimo de perigo para quem utiliza o mesmo espaço público. Elementos oriundos de um grupo específico de gente que procura insistentemente uma certa audiência, inexistente no seu quotidiano amorfo, estes homens e mulheres são pertença das nossas preocupações e a herança de uma globalização sem freio.
Outra ideia que ressalvo do artigo é o facto de se ser adolescente mais tarde e portanto adulto tardiamente, se compararmos a nossa existência com a da Idade Média. Nesses tempos idos o homem era herói, quase à saída do berço. Bastava ser-se hábil na construção de instrumentos, era-se um herói; bom caçador, era-se um herói; guerreiro aguerrido, era-se um herói… e sendo herói tinha garantido o seu público, a sua audiência.
Hoje, infelizmente, para ser-se herói, conduz-se a altas velocidades. O desejo não mudou assim tanto de há 600 anos a esta parte. O que se alterou foi a utilização de diferentes armas, mais mortíferas nos nossos dias que outrora. Por isso lemos ou vemos notícias que nos dão parte de números alucinantes de jovens do sec. XXI mortos em acidentes rodoviários. Infelizmente quando tal acontece, não só é o jovem que desaparece como com ele também a sua audiência se esfumaça no nevoeiro do infinito.
A questão é saber como é que aqui chegámos e como é que daqui se dá o salto para dias melhores.
Como, uma sociedade supostamente civilizada, deixa morrer livremente a sua juventude, garante de um futuro enquanto cultura milenar, já vimos. Praticamente “tudo” o que poderia ser descoberto, já o foi e o que falta não se encontra ao alcance do comum dos mortais.
É preciso redescobrir o prazer em fazer coisas novas – mas fazer coisas que possam ter uma audiência, um “feedback”.
Quantas vezes o que os nossos jovens produzem cai em saco roto ou tem uma aceitação quase nula?
Quantos jovens frustrados encontramos diariamente nas nossas escolas?
Que tempo dispensa a sociedade em geral aos jovens e como o faz?
A escola estagnou no tempo e espaço. Preocupada que está com conteúdos curriculares e transmissão de saberes, esqueceu-se de evoluir. E desse esquecimento nasce a ideia de que é uma prisão da qual se tem a necessidade imperiosa de fugir.
O exterior oferece mais. É mais excitante. A adrenalina, no exterior, está sempre à tona da pele. O exterior é emoção forte. Facilmente aí se pode encontrar a tal heroicidade prometida. Há mesmo a oportunidade de escolher a “sua audiência” que aplaude, não critica e não marca provas a caneta vermelha.
A escola é um local desprezível. Deveria ser de prazer e tornou-se em inferno. Já não há criação na escola. O prazer em criar algo do qual se possa sentir orgulho, passa pela “dor” emocional que os nossos jovens poderão ou não sentir.
A escola deveria ser um local de criação, de acção e de reconhecimento pelo trabalho realizado. A grande máxima DOR-PRAZER-CRIAR surge como linha de conduta dos jovens dos nossos dias. A sua aprendizagem faz-se sensorialmente, recordam-se – os jovens são jovens tardiamente.
Será que estamos preparados a viver sensorialmente uma sociedade cognitiva impulsionadora da competividade?

:: enviado por JS :: 3/08/2005 10:34:00 da manhã :: início ::
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