BRITEIROS2: julho 2007 <$BlogRSDUrl$>








domingo, julho 22, 2007

Moita Flores II

Exmº Senhor Presidente
Da Comissão de Ética
Da Assembleia da República
Deputado José Correia

Santarém, 16 de Abril de 2007

N/Ref.

Desculpe-me antecipadamente V.Ex.ª vir incomodá-lo como um problema aparentemente sem importância, uma espécie de barba mal feita, e que sendo um problema formal me dirija a V.Exª com tão pouca formalidade.
Imagine um sapato de verniz com uma pequena esfoliação no calcanhar. É esse o problema que venho expôr. O sapato sou eu, e presidente da câmara de Santarém é sapato gasto, endividado e sem grande margem de manobra para lhes reforçar os contrafortes ou deitar-lhes meias solas. O verniz uma deputada vossa, agora ilustre secretária de Estado e que responde pela graça de D.Idália Moniz.
Aliás, deve dizer em nome da arte de fazer política, que a senhora D.Idália foi excelsa vereadora desta autarquia e contribuiu alegremente para a ruína do meu sapato. Vereadora da cultura, diga-se, cargo que ocupou com grande zelo e discrição até ao dia que um chamamento divino lhe revelou a sua vocação para a Reabilitação e foi reabilitar para o governo.
Até aqui nada a apontar. Sei que são poucos os chamados mas raros os escolhidos. D. Idália respondeu ao chamamento e aceitou o apelo divino e eis que aí está para nosso grande conforto a secretariar o Estado com grande determinação e loquacidade.
Feita a apresentação, devo agora pedir o esclarecimento que, por não saber mais a quem me dirigir, submeto a V.Exª.
A nossa respeitável Secretária de Estado vive no concelho de Santarém e bastas vezes intervém aqui de forma pública. Até é deputada municipal, coisa que diga-se de passagem pouco frequenta. Confesso que me dá algum prazer vê-la por cá pois que até gosto da senhora e pessoalmente acho-a gentil e afectuosa.
Mas é raro encontrar a pessoa de quem gosto. Apresenta-se invariavelmente a Secretária de Estado, austero, divina. Bom, eu disse divina e com alguma base de convicção. É que a senhora passa por cima, julgo eu, das leis da República, e impõe de forma categórica a sua presença qual Diana enviada para caçar em nome de Zeus.


Chegados aqui, chegamos ao sapato e ao verniz. A Lei nº 40/2006 de 25 de Agosto, sobre o Protocolo do Estado, garante no seu artº 31 que no seu concelho, o presidente da câmara tem estatuto de ministro para as cerimónias públicas que aqui ocorrem. Mas a senhora no seu furor de secretariar o Estado, sobretudo em juntas de freguesia da sua cor política, teima que não (até já levei um raspanete por ter ousado dizer que era de outra forma), e que não, e porta-se como rainha a quem todos têm de prestar alvíssaras.
Pessoalmente não sou pessoa para me incomodar esta leitura napoleónica do poder. Quer presidir? Presida. Quer aspergir-nos a todos com a sua sabedoria reabilitada? Baixo a minha humilde careca perante o brilho solar que irradia da sua figura.
Mas também percebi que estas entradas de leão com saídas de deusa trazem água no bico. No meu entendimento violam a lei. Uma lei da República publicada durante o augusto governo a que pertence a augusta personagem. E das duas, uma. Ou a senhora Secretária de Estado não conhece a lei e é coisa grave. Ou conhecendo-a, não lhe liga puto, o que não é menos grave. A verdade é que tudo isto, sob a aparência de servir o Estado tem outras consignações. Reorganizar o seu partido desfeito com a última derrota eleitoral, amesquinhar o presidente da Câmara de Santarém, usar um bom sapato de verniz à custa dos sapatos remendões do desgraçado autarca crivado com as dívidas que a augusta personagem ajudou a construir.
Já percebeu V.Exª que esta carta não serve para repor honras espezinhadas porque a pessoa do presidente da Câmara, cuja vida é ser escritor, até se diverte e vai registando para memória futura estas atitudes que Eça de Queirós gostaria de ter conhecido. Mas o presidente da Câmara de Santarém não acha graça a que se violem leis da República, até porque é um dos seus garantes, e também não consegue aplaudir, como a pessoa do presidente aplaude, estas manifestações corriqueiras, narcísicas e petulantes de exercer o poder. Secretariar o Estado, na minha modesta opinião, não passa por este folclore de vaidades onde se esgotam personagens para melhores palcos.
Em Dezembro escrevi à senhora Secretária de Estado explicando-lha a lei que a sua maioria aprovou. Não ligou e acho que fez bem. Como pode senhora tão sobrecarregada com a arte de reabilitar preocupar-se com o afã de um presidente de câmara zeloso por fazer cumprir uma lei da República? Voltou à carga. E assim, aqui estou a pedir esclarecimentos a V.Exª.
1. O Artº 31º da Lei 40/2006 está revogado?
2. O Artº 31º não se aplica a Secretários de Estado que vivem no concelho?
3. O artº 31º é só para fazer de conta?
Esta pergunta é apenas para confirmar porque, quando aqui esteve Sua Excelência o Senhor Presidente da República, percebi que o Protocolo de Estado se cumpre.
4. Existe alguma legislação especial para o caso da Secretária de Estado da Reabilitação?
5. Estou enganado na interpretação da lei?
Ajude-me V.Exª. Sei que tenho os sapatos sujos e rotos, sem dinheiro para os mandar consertar e é sempre com alegria que vejo os sapatos de verniz da nossa augusta governante. Mas não sei se devo aceitar que me espezinhe. Se for em nome da República e como ajuda a resolver o défice, eu próprio me oferecerei para servir de passadeira, deixando que os brilhantes saltos se cravem nas minhas costas. Se é um mero exercício de vaidade pessoal, pesporrência política e orgulho narcísico, tenho mais que fazer do que aturar esta procissão de vaidades.
Ajude-me a esclarecer esta dúvida existencial. Se para mim a República é um bem absoluto, também é verdade que reconheço que perante esta enviada dos deuses haja bens terrenos que têm se ser sacrificados e disponho-me já a ser mártir da República para servir o verniz da senhora Secretária de Estado.

Creia-me com consideração


(Francisco Moita Flores)

PS: Como este conflito de vãs vaidades é suculento e é revelador de uma moral política extraordinária, informo V.Exª que darei voz pública à carta que vos envio, assim como à carta que em Dezembro enviei à senhora Secretária de Estado.

:: enviado por RC :: 7/22/2007 12:58:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

Moita Flores I

Exmª Senhora

Secretária de Estado da Reabilitação

D.Idália Moniz


Depois do nosso encontro em Amiais de Baixo, no passado dia 16, e do sibilino conselho que V.Exª me murmurou na hora da despedida, acorri apressado, num misto de ansiedade e desvanecimento, à procura da Lei do Protocolo de Estado. Não era caso para menos. Eu ousara declarar que, por gentileza, deixava V.Exª fechar a sessão em que nos encontrávamos e era óbvio o meu gesto cavalheiro pois pertencia ao Presidente da Câmara Municipal de Santarém. Mas depois do discreto e merecido raspanete, reconheço que saí de Amiais com o coração em sobressalto, coração apertado de penitências, voz embargada de vergonha pois, mais uma vez, este ‘Presidente atípico’ como V.Exª certeiramente me catalogou depois de uma das minhas ‘gaffes’ à entrada, teria terminado em glória com mais ‘atipicidade’ à saída.
Sobravam-me quilómetros até ao canto onde arrumo, com cautela de santuário, as leis do Estado. Era grande a aflição, confesso, e saltei sobre a invocada, bem impressa no nosso ilustradíssimo Diário da República e li. Ou melhor, reli pois que fizera em tão precioso documento uma lavadela de olhos logo quando fora publicada.
Soaram-me sinos nos sentidos. A nossa bem amada Lei nº 40/2006 de 25 de Agosto mostrava, num formalíssimo e severíssimo protocolo who is who a galeria social do Estado. E lá estava, logo a abrir a primeira decepção. Os nossos tão aplaudidos Secretários de Estado remetidos para uma ignóbil 20ª posição e os Presidentes de Câmara atirados confortavelmente para o 41º lugar da tabela de classificação por pontos. E digo confortavelmente, pois é posição que permite a autarca menos escrupuloso com as formalidades do Estado, sair discretamente durante uma cerimónia enfadonha e ir até ao jardim fumar o seu cigarrito e tornar a entrar para o seu discreto 41º lugar sem que alguém dê pela sua falta.


Ora dizia eu que reli a lei e a minha alma exultou. Não me espalhara outra vez. V.Exª sabe, muitos dos meus amigos chamam-me a atenção, e com razão, para o facto de eu entender o Protocolo de Estado como um problema de sapato e de verniz. E se me aplaudem por dar muita importância ao sapato, não deixam de reparar que me preocupo pouco com o verniz. Reconheço que sou filho de más leituras. A severidade de Camilo ou de Eça para o excesso de verniz da classe política, pouco preocupada com o feitio do sapato, foi herança que me desnorteou os cromossomas e bem me penitencio de tanta distracção. Mas enfim! Agora que reli fico com a consoladora certeza que, por esta vez, em terras de Amiais de Baixo, este vosso humilde servo foi, não só gentil, mas respeitador da Lei do Verniz. É que existe um maçador artº 31, nº 1, que coloca, no seu município, o presidente da câmara numa posição que diria, tonitruante. Preside a tudo, Santo Deus! E só lhe ganha a palma Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, Primeiro Ministro e, se for fora dos Paços do Concelho, qualquer ministro. Nem uma palavra para Secretários de Estado! Nem um mero afago, um simples carinho. Nada!
Se cominarmos esse antipático artº 31 com o pretensioso artº 33 , então Secretário de Estado tem lugar depois dos nossos bons Presidentes de Junta tomarem assento. Uma injustiça, afirmo eu. Um verdadeiro agravo à brilhante sonoridade que justamente submete quem ouve o título de Secretário de Estado. Não fosse V.Exª uma brilhante Secretária de Estado e não desistiria de a exortar a mobilizar os seus colegas de titulatura para greve reivindicativa contra si própria, ou melhor dizendo, contra o seu inestimável governo.
Não posso dissertar mais sobre esta matéria porque uma outra inquietação me assalta. A minha primeira leitura, e a recente leitura, da Lei do Verniz associada ao discreto raspanete que V.Exª me pregou, com elegância é certo, me conduz a uma terrível descoberta: V.Exª não conhece as leis produzidas pela Assembleia da República que a elegeu! Que fez de V.Exª competente Secretária de Estado! Que deu a V.Exª o rápido brilho que tantos camaradas seus procuram em vão há tanto tempo!
Já se percebeu, com certeza que V.Exª percebeu, que sendo o actual Presidente de Câmara Municipal de Santarém, pessoa pouco dada a essas sublimidades mundanas que não vou fazer do meu obscuro, mas rigoroso, conhecimento da Lei do Verniz uma bandeira de luta pelo bem do nosso concelho. Nem tão pouco essa Lei resolverá o buraco financeiro que o executivo camarário, que teve a honrosa presença de V.Exª, deixou aos vindouros como herança. E para continuar a ser elegante, afasto como se afasta Belzebu, a flatulenta ideia de enviar a um Secretário de Estado cópia da Lei do seu mandato só pelo reles motivo de a desconhecer.
Eu até acho bem que os Secretários de Estado desconheçam as leis que produzem os seus governos e parlamentos. Deixa-lhes o espírito mais livre para as grandiosas tarefas que quotidianamente carregam sobre os ombros, nomeadamente para algum verniz nos gestos e actos.. E V. Exª com uma Secretaria de Estado tão difícil, que obriga a produção de sapato em abundância faz bem em deixar a minudência do verniz para um pobre autarca.
Por esta mesma razão, venho informar V.Exª que a partir de agora vou encarregar-me dessa vulgaridade que os meus amigos me censuram de desleixar. Produza V.Exª os sapatos que do verniz tratarei com gosto e prazer em servi-la.
Confesso que é sacrifício. Sacrifício pessoal, entenda-se. Prefiro mil vezes ver um Secretário de Estado a adornar uma bela mesa, enfeitada de apoiantes e profissionais da política, com um apontamento de flores no centro, uns quantos pacotes de manteiga, mais alguns salgados a condizer, e gravatas distintas, soberbas, do que ser forçado a impor o meu rebelde temperamento a tão augustas personagens, incluindo o pacote de manteiga. Mas se nada valho entre estrelas, querubins e safiras, tenho certeza certa que o Presidente da Câmara Municipal de Santarém, cidade e concelho de prestígio, vai definitivamente ocupar o lugar a que tem direito, por respeito ao augusto Governo de V.Exª e informar os Presidentes de Junta das suas responsabilidades formais. Com grande desgosto meu. Mas seguramente aliviando V.Exª do pesado fardo dos protocolos que desconhece mas com bom proveito para o nobre ofício de secretariar o Estado.


Creia-me com amizade bem disposta e consideração alegre

Com os melhores cumprimentos

O Cidadão


(Francisco Moita Flores)

:: enviado por RC :: 7/22/2007 12:57:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

sábado, julho 14, 2007

Milú


:: enviado por RC :: 7/14/2007 01:01:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

quarta-feira, julho 11, 2007

Briteiros Viagens - Açores

Como as férias estão a chegar, aproveito para abrir o suplemento Briteiros Viagens que não pretende ser guia de coisa nenhuma mas apenas uma visão pessoal sobre o antes e o depois dos lugares que visitamos. No fim do post perceberão que a iniciativa não é altruísta.
Este ano, não sei se por influência dos 5 minutos que vi da telenovela da TVI ou por já conhecer um pouco, um impulso qualquer levou-me a arrastar a família para os Açores. Apesar dos protestos da miudagem, pensei que sempre seria melhor do que acompanhar os meus compatriotas construtores civis para Porto Seguro, para Pipa ou Punta Cana ou mesmo para o cimento do Algarve. Marquei rapidamente a viagem para o fim deste mês e foi então que comecei a ter algumas dúvidas.
O problema é que já estive uma vez nos Açores. Quer dizer, não sei se é um problema mas quando lá estive, há uma boa dezena de anos, foi em trabalho e, para além das obrigações profissionais terem deixado pouco espaço para o turismo, lembro-me de que choveu todos os dias - apanhei a maior carga de água que alguma vez vi na vida com inundações, mortos, desalojados, estradas e pontes destruídas – o nevoeiro não me deixou ver quase nada e, pior do que tudo, a terra tremia que se fartava. Nada de dramático, uns estremeções que os locais já nem notam, mas estremecia. Segundo as estatísticas, há 6000 sismos nos Açores dos quais 600 são um bocadinho mais do que uma vibração o que, pelas minhas contas, me dá uma probabilidade de 3% para apanhar com uma coisa jeitosa. Não é muito, dirão. Discordo. Acho muito pouca piada a que a terra se mexa debaixo dos meus pés. Por isso não gosto de barcos e o avião só mesmo quando não há outro meio para me deslocar (o que para ir aos Açores deixa poucas alternativas). No caso da terra ainda é pior porque considero que a terra é composta por sólidos que, por definição, não têm nada que se mexer sozinhos. Se é para passar o tempo agarrado às paredes, antes ficar em casa.
Com estes pensamentos a ameaçarem estragar-me as férias, resolvi fazer um Google “Açores + clima” seguido de “Açores + sismos”. Com o primeiro fui parar à Wikipédia para ficar a saber que “arquipélago dos Açores é visitado com frequência por ciclones de origem tropical, muitas vezes assumindo força de furacão” e que são comuns no mês de Agosto (É à justa). Vi ainda este mapa de previsões do Instituto Meteorológico e mesmo um leigo como eu é capaz de perceber que a coisa não promete nada de bom. Já um pouco assustado mas tendo em mente que na Wikipédia está quase tudo errado e que os meteorologistas só sabem fazer previsões para daqui a 50 anos, lembrei-me do que dizia um colega açoriano: chove todos os dias mas chove “no maar”. Sendo assim, pensei, apenas tive azar quando lá estive e choveu em terra que se fartou. Como a única vez que conto ir ao mar é para ir ver os cachalotes, a chuva não será problema já que os bichos também atiram com água que se fartam e mais água menos água…
Mais preocupante é a história dos sismos. Com o Google fui parar a esta página. Se repararem bem nos mapas, não há um único sitio que não tenha um pontinho preto correspondente a um sismo. Aquilo não são mapas, são borrões. E o sismograma parece as ondas sonoras do Marco Paulo a cantar “Anarchy in the UK”.
Isto significa que, em praticamente qualquer lado onde ponha os pés, já houve um sismo. Pequeno, grande ou enorme. Tentei, então, descobrir qual a probabilidade da repetição de sismos com epicentro exactamente no mesmo lugar. Parece que a probabilidade é pequena o que me permite organizar a viagem de maneira a passar sempre pelos pontos negros pequeninos e evitar estar por cima do epicentro de algo “em grande”.
Para além de terem uma média de 20 sismos por dia, há ainda pior: os Açores têm vulcões. Só que não são vulcões como o Etna ou o Vesúvio que estão sossegados ou os vulcões maricas da Auvergne francesa que não mandam um calhau cá para fora há milhares de anos. Os Açores têm vulcões que estão vivos e que, a qualquer instante, podem fazer com que fiquemos para a posteridade nas mesmas posições que os cidadãos de Pompeia. Como se isto não bastasse, há mais vulcões nos Açores que jogadores na lista de compras do Benfica deste Verão.
Quando estive em S. Miguel, devido à chuva e ao nevoeiro, o único vulcão que consegui ver dá pelo nome de Sete Cidades e é uma dessas paisagens que nos deixam os olhos lavados durante anos. Como não há bela sem senão, segundo as pessoas que estudam estas coisas, debaixo daquela beleza toda e no fundo da placidez daquele lago, há um inferno em ebulição que a qualquer momento pode atirar para cima do viajante incauto toneladas de magma incandescente mais toda a água que por ali se acumulou. Convenhamos que não deve ser muito agradável.
Ainda mais inquieto, lancei o Google “Açores + serpentes venenosas” que não deu nada e “Açores + aquecimento global” só anuncia catástrofes lá para 2050 (entretanto, espero que a TAP já me tenha conseguido trazer). Também o “Açores + terrorismo” só indica ligações para os voos da CIA, o que não me preocupa muito porque não tenho nenhum voo marcado nessa companhia.
Do que me lembro, os Açores são uma terra de paisagens formidáveis, de gente ainda mais formidável, de milhões de vacas e de comida boa. Apesar do que encontrei na Net, creio que vale a pena o risco e, se os vulcões se mantiverem quietos e a terra não mexer mais do que o habitual, cá estarei para contar como foi.
Quem tenha tido paciência para chegar até aqui é porque também gosta dos Açores. Por isso, estou agora à vontade para formular o que não tive coragem de colocar no início: se alguém tiver sugestões onde se pode comer bem, onde a terra não trema quando nos apresentam a conta e onde a comida tenha a magia de uma erupção vulcânica, faça o favor de me instruir.


:: enviado por U18 Team :: 7/11/2007 04:23:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

segunda-feira, julho 09, 2007

A “flexisegurança”


© Desenho de Bandeira - Diário de Notícias

O objectivo prioritário das medidas preconizadas pela “flexisegurança” não é outro senão desregular ainda mais as relações laborais na Europa. É esse o sentido profundo de propostas como “facilitar as transições no mercado do trabalho, apoiando a aprendizagem ao longo da vida e desenvolvendo a criatividade de toda a mão-de-obra”. Se alguém tem dúvidas, vejam-se algumas outras “pérolas” do texto:
“Condições de trabalho e de emprego demasiado protectoras podem desencorajar os empregadores de recrutar durante os períodos de retoma económica”. Por isso, há que “evitar os custos inerentes ao cumprimento das regras relativas à protecção do emprego e dos prazos de pré-aviso e ao pagamento das correspondentes contribuições para a segurança social”. No seu afã pedagógico, o Livro Verde dá como exemplo o modelo dinamarquês que, pelas mãos do actual governo conservador, deixou de ser um dos mais avançados em matéria de direitos sociais para passar a suprimir as indemnizações por despedimento, reduzir os prazos de pré-aviso para cinco dias, eliminar o salário mínimo e extinguir os limites dos horários de trabalho.
O logro do conceito de “flexisegurança” é pois bem claro: trata-se de fazer crer que a melhor (ou a única) maneira de assegurar o emprego é fazer com que os trabalhadores aceitem uma mobilidade permanente, uma ininterrupta reciclagem profissional e que, em última análise, se disponham a servir as empresas que não contraíram com eles compromisso algum, passando a converter-se em falsos “autónomos” que carecem da única coisa que a autonomia pode garantir, a saber, os meios de produção próprios. No limite, teríamos de converter-nos todos em trabalhadores “free-lancers”.
Que em determinados ofícios muito especializados essa seja uma situação até certo ponto vantajosa para o trabalhador (que adquiriu conhecimentos técnicos suficientes para tornar possível possuir meios de produção próprios, com a vantagem acrescida de não ter que estar submetido a horários de trabalho rígidos), isso não significa que o modelo “free-lancer” possa ser aplicável, nem de perto nem de longe, à generalidade dos trabalhos e dos trabalhadores.
Num mercado laboral consumar-se-ia assim o ideal de todo o explorador (eufemisticamente chamado “empregador”): dispor de uma massa amorfa de vendedores de força de trabalho com os quais poderia negociar mano-a-mano, sem a chatice da intermediação sindical, o que colocaria definitivamente o capital numa posição de força absoluta frente ao trabalho.

A primeira etapa do processo de discussão do Livro Verde (uma ronda de consultas públicas) ficou concluída em Março passado. Em Junho ficaram definidas as linhas gerais da “flexisegurança” que foram agora debatidas em Guimarães. Todo o processo deverá culminar em Dezembro, provavelmente com uma série de novas directivas.
É de desejar que os sindicatos não se limitem a pôr paninhos quentes como fizeram com a nefasta directiva Bolkestein, pela qual se regem por exemplo certas companhias aéreas de “low-cost”, registadas em países da UE com escassa protecção laboral (Irlanda por exemplo), para poderem aplicar essas condições de trabalho precárias aos seus empregados em qualquer outro país da União. O velho argumento dos maus negociadores, segundo o qual há que contentar-se com o mal menor para não ter que engolir um mal maior, esquece-se de que, na luta de classes, o maior dos males para os de baixo é deixarem de lutar. Sobretudo, por uma razão: é que os de cima não deixam nunca de fazê-lo.

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:: enviado por JAM :: 7/09/2007 08:48:00 da manhã :: 0 comentário(s) início ::

domingo, julho 08, 2007

FMI: a história repete-se

A contestação mundial ao FMI é cada vez maior. Os movimentos altermundialistas reclamam há anos o seu desmantelamento e a sua substituição por uma instituição com objectivos radicalmente diferentes, centrados na garantia dos direitos humanos fundamentais. São cada vez mais os governos que tentam livrar-se da tutela opressiva do FMI. A Venezuela anunciou em Abril de 2007 que se retirava da organização. Em Dezembro de 2005, Brasil e Argentina reembolsaram de uma só vez tudo o que deviam. Outros, como a Indonésia, as Filipinas ou o Uruguai, seguiram a mesma via, privando assim o FMI dos seus principais clientes.
Isso teve consequências nos financiamentos do FMI já que um reembolso antecipado implica uma grande redução dos juros a cobrar. Para tentar minorar os estragos, em Janeiro de 2007 um comité de consultores encarregado de estudar a questão recomendou a venda de 400 toneladas de ouro. Só que os Estados Unidos não aceitaram a proposta e uma reunião para discutir o assunto acaba de ser adiada, o que só contribui para aumentar a confusão.
A pedido dos Estados Unidos — nervoso porque o yuan está subavaliado, o que favorece as exportações chinesas e aumenta o deficit comercial americano — o FMI acaba de lançar outra acha para a fogueira da contestação: a vigilância das taxas de câmbio das moedas. Mas os chineses fazem ouvidos de mercador e juntam-se ao coro dos protestos contra o FMI, acusando-o de ser um instrumento nas mãos do governo de Bush.
Ao mesmo tempo, sete países da América Latina (Venezuela, Argentina, Bolívia, Equador, Brasil, Paraguai e Uruguai) lançam o Banco do Sul, encarregado de promover à escala regional uma lógica radicalmente distinta da — brutal e mortífera — imposta há décadas pelo FMI e pelo Banco Mundial.

Há poucos dias, foi publicado pela Merrill Lynch / Cap Gemini o relatório sobre a riqueza do mundo que revela que, em 2006, o número de milionários cresceu 8,3% e que o património por eles acumulado cresceu 11,4% e é já mais de doze vezes superior à dívida externa de todos os países em vias de desenvolvimento. Enquanto isso, as populações pobres definham na miséria, cada vez mais fragilizadas pelo forte aumento do preço dos cereais nos mercados mundiais. A produção cerealífera — em particular o milho — destina-se cada vez mais a fabricar agro-combustíveis para os países mais industrializados, o que impele o risco de produzir dentro de pouco tempo crises alimentares graves nos países do Sul.
É preciso acabar com este modelo económico que só serve para fazer os ricos mais ricos e os poderosos mais poderosos. É preciso acabar com este modelo económico que fracassou porque é um terreno onde se desenvolve a dívida, a pobreza e a corrupção. Como o Banco Mundial, o FMI foi um dos principais promotores e suporta uma pesada carga de responsabilidade por este modelo económico.
Agora que o FMI está a afundar-se, Rodrigo Rato foi o primeiro a abandonar o navio. Consta que Sarkozy pretende que o novo director-geral seja um francês e deseja oferecer o lugar ao socialista Strauss-Kahn. Só pode ser um presente envenenado.


:: enviado por JAM :: 7/08/2007 10:04:00 da manhã :: 0 comentário(s) início ::

sábado, julho 07, 2007

Querem salvar o planeta? Comprem um Hummer

De repente, descobriu-se que a minha geração e as gerações que a precederam fizeram tudo mal. Não chega ter levado a esperança de vida para valores que há dois séculos seriam considerados extraterrestres, não chega que nos possamos deslocar facilmente e de forma relativamente económica, não chega termos desmentido Malthus. Esquecemo-nos do Planeta. Quer dizer, sendo uns seres terrivelmente egoístas, desenvolvemos tecnologia que nos propicia bem-estar mas que fará com que os nossos filhos vivam num Planeta extremamente frio ou extremamente quente (ainda não está decidido), sem ursos polares, no meio de lixo tóxico, sem florestas e sem gelo nos pólos (ou talvez com mais gelo, não se sabe ainda bem).
Felizmente que algumas pessoas da minha geração, como o Al Gore e o Bono, e das gerações seguintes se aperceberam da nossa tendência suicida e estão cá para nos salvar.
A Quercus tem um site em que nos ensina a escolher produtos que combatam as “alterações climáticas” (prudentemente, a Quercus não toma posição se isto vai aquecer ou arrefecer). Neste momento, há três top-tens: Lâmpadas, Máquinas de Lavar Roupa e Automóveis.
Bom, de máquinas de lavar não percebo nada mas se a Quercus diz que a Miele W2839 I WPM Softtronic é a que me fará poupar mais água e mais electricidade mesmo que não lave bem a roupa, eu acredito na Quercus (só dizer à Quercus que a Miele custa 1600 euros o que é um bocadinho caro para uma máquina de lavar).
As lâmpadas também não são o meu domínio de predilecção mas sei que as lâmpadas incandescentes funcionam porque a electricidade faz brilhar um filamento enquanto nas lâmpadas de baixo consumo a electricidade “acende” um gás dentro das lâmpadas que as faz emitir luz. Duram mais e consomem menos. Pois. O problema é que para “acender” o gás é necessário uma pequena quantidade de mercúrio e ainda contêm mais dois ou três produtos que se encontram na tabela periódica e que, em geral, não fazem muito bem à saúde. Quer dizer, são mais eficientes energeticamente mas são um bocado complicadas para reciclar. Ah, e são um bocadinho mais caras que as outras.
Já os carros são outra história. Acontece que gosto de carros e de desporto automóvel. Por isso fui ver o site da Quercus. Esquecendo os carros mais pequenos que só um celibatário sem amigos e sem animais de estimação ou um hippie retardado seriam capazes de comprar (o hippie tenho duvidas, preferem os 2 Cavalos) e as carrinhas que considero um dos objectos mais inestéticos que o Homem criou, os outros são carros que nunca compraria. Ou porque são mal motorizados, ou porque são caros em relação a outra alternativa ou porque são simplesmente feios.
No entanto, o que me chamou a atenção foi o inevitável Toyota Prius. O Prius tornou-se o grande ícone dos amigos-do-ambiente-que-querem-continuar-a-conduzir-carros. O Prius é híbrido gasolina/electricidade e por isso tem a melhor “Eco avaliação”. Quer dizer, para a Quercus é o carro que todos devemos conduzir para que o urso polar não desapareça, a
Femeniasia balearica não se extinga e o lince da Malcata não seja incomodado.
O Prius funciona na base de um motor normal complementado por baterias. As baterias são recarregadas pelo funcionamento do motor a gasolina ou pelo travão (não se podem recarregar pela tomada eléctrica). Quando o carro está parado, o motor pára também o que faz com que nos engarrafamentos seja bastante económico no consumo. Na estrada, em que as baterias já não chegam, tem consumos parecidos com outros carros económicos.
Dito assim, o Prius parece um monstro de economia e a merecer o pedestal da ecologia. Pois é. O pequeno problema do Prius é que tem baterias e as baterias funcionam com níquel. O níquel sai de minas situadas em Sudbury no Canada. Do Canada o níquel vem para a Grã-Bretanha para ser refinado em Gales. Daqui é enviado para a China para ser transformado em espuma e daqui finalmente para o Japão onde as baterias são fabricadas. Uma boa parte é recambiada para os EUA e para a Europa onde os Prius são fabricados.
Devido ao tratamento do níquel, a área de Sudbury começa a ter tantos problemas de poluição que até a Greenpeace começa a sentir-se incomodada.
Como o preço não parece ser uma preocupação da Quercus, vamos comparar o Prius ao Hummer. Porquê o Hummer? Primeiro, porque é o carro que eu compraria se não houvesse juros bancários e se vivesse no Alentejo. Segundo, porque o Hummer é o Satanás dos ecologistas: consome 25 litros aos 100, é grande, praticamente desprovido de utilidade e está à vontade em qualquer terreno. Terceiro, porque é uma obra de arte da engenharia humana e, quarto, porque um recente estudo da CNW lançou a polémica sobre quem é mais “verde”.
O Hummer é menos complexo a reciclar que o Prius, dura 3 vezes mais e se tivermos em conta o custo energético combinado do fabrico, transporte, condução, reciclagem e não apenas das emissões de CO2 como faz a Quercus, o Hummer é mais eficiente do ponto de vista energético.
O Prius tem ainda um “pequeno” defeito que é apresentado como uma virtude: não faz barulho nenhum quando em modo bateria, ou seja, nas cidades. Fabuloso, não é? Perguntem a um peão distraído ou a um cego o que é que pensam.
O Prius é o produto de um génio de Marketing da Toyota que sabe reconhecer onde estão as modas. Utiliza uma velha tecnologia que é um desastre para o ambiente mas que o faz parecer moderno, é um pesadelo de reciclagem e um perigo para os peões. O Hummer é honesto. Não pretende ser “verde”, consome combustíveis fósseis que se farta, ocupa o espaço de três carros mas dura mais, ouve-se e vê-se ao longe, é mais eficiente energeticamente e mais fácil de reciclar.
Querem salvar o planeta? Andem de transportes públicos quando for possível, comprem um Hummer e guardem-no por muitos anos.

PS: Nem sequer me lembrei que era hoje. Quando estava a escrever este post, recebi um Mail da MSN Music a propor a compra das músicas do SOS Earth. Pois.



:: enviado por U18 Team :: 7/07/2007 10:38:00 da tarde :: 1 comentário(s) início ::