BRITEIROS2: maio 2007 <$BlogRSDUrl$>








terça-feira, maio 29, 2007

Sete razões para fazer greve

[...]
3. A perda de direitos na função pública. A estratégia de concentrar o fogo sobre os trabalhadores do Estado é inteligente. Criar um bode expiatório, isola-lo socialmente e começa por aí o combate político e ideológico. A extrema-direita faz isso com os imigrantes, a direita conservadora com os miseráveis que vivem “à custa dos subsídios” e os liberais com os funcionários do Estado.

É evidente que se o nosso Estado é irracional no uso dos seus recursos financeiros, também o é no uso dos seus recursos humanos. Há situação disparatadas em quase todos os serviços públicos. Mas devemos ser claros: num país em que se recebe mal, o “emprego para a vida” foi a forma do Estado compensar a fragilidade do tecido económico do país. Se à perda de direitos dos funcionários do Estado não corresponde um aumento de direitos dos funcionários do privado, não estamos a equilibrar, estamos apenas a baixar a fasquia. Sobretudo quando sabemos que em países pobres o sector público funciona como padrão para o resto do mercado de trabalho (vejam-se os aumentos salariais).

Infelizmente, os sindicatos do sector do Estado não têm sabido falar com o resto dos trabalhadores. Numa lógica corporativa, abandonaram o discurso político capaz de ganhar a solidariedade dos restantes trabalhadores.

4. A reforma da segurança social é um remendo e não resolve a o problema da insustentabilidade do sistema diminuindo ainda mais as já paupérrimas reformas em Portugal. É na receita e na redistribuição das contribuições que o problema pode ser resolvido.

A formula encontrada cria uma injustiça indefensável: o trabalhador que não queira prolongar o tempo de trabalho (tendo em conta a indexação da idade de reforma à esperança média de vida) tem duas possibilidades: ou desconta mais ou recebe menos. Como é evidente, para os trabalhadores com menores recursos estas duas possibilidades são impossibilidades. Ou seja, os trabalhadores que ganham menos e que, em muitos casos, têm trabalhos mais violentos, trabalharão até mais tarde do que os mais privilegiados. Inaceitável.

5. A redução do poder de compra dos portuguesas é uma marca deste governo. A inflação foi, em 2006, de 3,1%. 63% superior à média europeia (1,9%). A electricidade é 24% mais cara do que a média europeia, o gás doméstico 38% e gasolina aumentou de 20% a 34%, muito mais do que na UE. As despesas em saúde, transportes e habitação tiveram também aumentos muito superiores ao habitual. Dois milhões de portugueses tiveram aumentos inferiores ao da inflação e estamos com um poder de compra 29% abaixo da média europeia (contando com os 25 países). O custo médio do trabalho é 49,5% inferior à média da UE.

À sensível e quase insignificante retoma económica não corresponde nem criação de emprego nem, para quem trabalha, um aumento da qualidade de vida. Pelo contrário. O aumento da emigração e a inversão do saldo migratório é a mais clara prova do falhanço deste governo em todas as áreas que para si deviam ser prioritárias.

6. A diminuição, em quantidade e em qualidade, dos serviços públicos disponibilizados aos cidadãos, em que a saúde, o serviço mais básico de qualquer sociedade que se pretenda socialmente democrática, é o melhor exemplo, parece ser um cavalo de batalha de José Sócrates.

7. Será o assunto da Presidência portuguesa da União Europeia e dominará os próximos dois anos da política de emprego: a flexigurança.

Trata-se da importação de um conceito escandinavo, mas é uma contrafacção. Na realidade, o modelo escandinavo tem uma premissa: ao aumento da flexibilidade do mercado de trabalho corresponde a qualificação (que dá maior autonomia ao trabalhador) e o aumento da protecção do Estado (que garante apoio social e económico ao desempregado em transição, formação profissional e recolocação). Mais: corresponde a uma imposição de regras às empresas. Nem ela é comportável para os magros cofres públicos portugueses, nem ela é adaptável ao mercado português, nem ela tem qualquer correspondência com a realidade política e social nacional, nem é nesse sentido que têm ido todas as reformas que este governo tem feito. Mais valia que dissesse, como ouvi da boca do presidente da CIP, ao que vem: o que se quer não é flexigurança nenhuma, é mesmo e apenas flexibilidade sem qualquer medida de segurança.

O governo promete com o uso desta palavra mágica que à flexibilização do mercado de trabalho corresponderá um aumento das prestações sociais. Só acredita quem passe o dia no largo do Rato. É isto que mais irrita: Sócrates propõe na realidade o mesmo que qualquer neo-liberal mas sempre com uma farpela muito modernaça. O que Sócrates nos propõe é a desregulação do mercado de trabalho sem qualquer garantia. Daí resultaria um desastre social.

Feito o balanço destes dois anos, o país está pior e nada de fundamental distingue José Sócrates de Durão Barroso. A prioridade do combate ao déficit (importante, mas inútil se esmagar tudo o resto) é a única linha política deste governo. Aliás, a haver alguma distinção (sobretudo se acrescentarmos as manobras para reduzir a liberdade de imprensa), ela será para pior. Pelo menos do ponto de vista de qualquer pessoa que se considere de esquerda ou que tenha as preocupações sociais como o centro do seu pensamento político. Talvez Sócrates vença apenas numa coisa: conseguido o que o PSD nunca conseguiria - queimar a oposição à sua esquerda - anulou igualmente a oposição à sua direita. Assustador para um país mergulhado numa grave crise social. A greve geral é a forma mais eficaz de travar esta vertigem "socialista" (com muitíssimas aspas).

Nada disto retira as críticas que fiz ao método de marcação e à estratégia e táctica definidas para esta greve geral. as lutas têm o seu modo e o seu tempo. Falhar nelas é piorar o que já está péssimo. As boas razões para esta greve são as que mereceriam os melhores procedimentos. Esperemos que as agendas partidárias não funcionem contra os objectivos justos desta greve. Esperemos que com tantas boas razões para ser punido, José Sócrates não saia dela reforçado. Se assim for, alguém terá de explicar porquê. Se assim não for, estão de parabéns e serei o primeiro, com genuína alegria, a rejubilar. Esperemos portanto todos que eu me engane.

PS: Os serviços mínimos definidos são uma violação sem precedentes do direito à greve. Se a definição de serviços mínimos é que todos os serviços regulares de uma empresa funcionam, a greve passa a ser irrelevante. Quem quer por via administrativa inviabilizar greves é bom que seja claro e diga a todos que defende a restrição deste direito constitucional. Não deixa de ser curioso que o governo que de forma mais clara desrespeita esta conquista da democracia seja um governo do PS. Mais um elemento de reflexão para a base eleitoral socialista".

Daniel Oliveira, Arrastão

:: enviado por JAM :: 5/29/2007 06:45:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

domingo, maio 27, 2007

Barreto

ENFIM, SÓ!

Público, 27.05.2007
António Barreto
Retrato da Semana

A saída de António Costa para a Câmara de Lisboa pode ser interpretada de muitas maneiras. Mas, se as intenções podem ser interessantes, os resultados é que contam. Entre estes, está o facto de o candidato à autarquia se ter afastado do governo e do partido, o que deixa Sócrates praticamente sozinho à frente de um e de outro. Único senhor a bordo tem um mestre e uma inspiração. Com Guterres, o primeiro-ministro aprendeu a ambição pessoal, mas, contra ele, percebeu que a indecisão pode ser fatal. A ponto de, com zelo, se exceder: prefere decidir mal, mas rapidamente, do que adiar para estudar. Em Cavaco, colheu o desdém pelo seu partido. Com os dois e com a sua própria intuição autoritária, compreendeu que se pode governar sem políticos.

Onde estão os políticos socialistas? Aqueles que conhecemos, cujas ideias pesaram alguma coisa e que são responsáveis pelo seu passado? Uns saneados, outros afastados. Uns reformaram-se da política, outros foram encostados. Uns foram promovidos ao céu, outros mudaram de profissão. Uns foram viajar, outros ganhar dinheiro. Uns desapareceram sem deixar vestígios, outros estão empregados nas empresas que dependem do Governo. Manuel Alegre resiste, mas já não conta. Medeiros Ferreira ensina e escreve. Jaime Gama preside sem poderes. João Cravinho emigrou. Jorge Coelho está a milhas de distância e vai dizendo, sem convicção, que o socialismo ainda existe. António Vitorino, eterno desejado, exerce a sua profissão. Almeida Santos justifica tudo. Freitas do Amaral reformou-se. Alberto Martins apagou-se. Mário Soares ocupa-se da globalização. Carlos César limitou-se definitivamente aos Açores. João Soares espera. Helena Roseta foi à sua vida independente. Os grandes autarcas do partido estão reduzidos à insignificância. O Grupo Parlamentar parece um jardim-escola sedado. Os sindicalistas quase não existem. O actual pensamento dos socialistas resume-se a uma lengalenga pragmática, justificativa e repetitiva sobre a inevitabilidade do governo e da luta contra o défice. O ideário contemporâneo dos socialistas portugueses é mais silencioso do que a meditação budista. Ainda por cima, Sócrates percebeu depressa que nunca o sentimento público esteve, como hoje, tão adverso e tão farto da política e dos políticos. Sem hesitar, apanhou a onda.

Desengane-se quem pensa que as gafes dos ministros incomodam Sócrates. Não mais do que picadas de mosquito. As gafes entretêm a opinião, mobilizam a imprensa, distraem a oposição e ocupam o Parlamento. Mas nada de essencial está em causa. Os disparates de Manuel Pinho fazem rir toda a gente. As tontarias e a prestidigitação estatística de Mário Lino são pura diversão. E não se pense que a irrelevância da maior parte dos ministros, que nada têm a dizer para além dos seus assuntos técnicos, perturba o primeiro-ministro. É assim que ele os quer, como se fossem directores-gerais. Só o problema da Universidade Independente e dos seus diplomas o incomodou realmente. Mas tratava-se, politicamente, de questão menor. Percebeu que as suas fragilidades podiam ser expostas e que nem tudo estava sob controlo. Mas nada de semelhante se repetirá.

Oestilo de Sócrates consolida-se. Autoritário. Crispado. Despótico. Irritado. Enervado. Detesta ser contrariado. Não admite perguntas que não estavam previstas. Pretende saber, sobre as pessoas, o que há para saber. Deseja ter tudo quanto vive sob controlo. Tem os seus sermões preparados todos os dias. Só ele faz política, ajudado por uma máquina poderosa de recolha de informações, de manipulação da imprensa, de propaganda e de encenação. O verdadeiro Sócrates está presente nos novos bilhetes de identidade, nas tentativas de Augusto Santos Silva de tutelar a imprensa livre, na teimosia descabelada de Mário Lino, na concentração das polícias sob seu mando e no processo que o Ministério da Educação abriu contra um funcionário que se exprimiu em privado. O estilo de Sócrates está vivo, por inteiro, no ambiente que se vive, feito já de medo e apreensão. A austeridade administrativa e orçamental ameaça a tranquilidade de cidadãos que sentem que a sua liberdade de expressão pode ser onerosa. A imprensa sabe o que tem de pagar para aceder à informação. As empresas conhecem as iras do Governo e fazem as contas ao que têm de fazer para ter acesso aos fundos e às autorizações.

Sem partido que o incomode, sem ministros politicamente competentes e sem oposição à altura, Sócrates trata de si. Rodeado de adjuntos dispostos a tudo e com a benevolência de alguns interesses económicos, Sócrates governa. Com uma maioria dócil, uma oposição desorientada e um rol de secretários de Estado zelosos, ocupa eficientemente, como nunca nas últimas décadas, a Administração Pública e os cargos dirigentes do Estado. Nomeia e saneia a bel-prazer. Há quem diga que o vamos ter durante mais uns anos. É possível. Mas não é boa notícia. É sinal da impotência da oposição. De incompetência da sociedade. De fraqueza das organizações. E da falta de carinho dos portugueses pela liberdade.

:: enviado por RC :: 5/27/2007 07:58:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

quarta-feira, maio 16, 2007

O bode expiatório

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Com início em 1990, o Banco Mundial encabeçou a exigência para que a União Soviética impusesse imediatamente aquilo a que chamava uma “reforma radical”. Quando Mikhail Gorbachev se recusou a seguir o plano, Ieltsin entrou em cena e não deixou que nada nem ninguém — nem mesmo os políticos russos eleitos pelo povo — se entrepusesse no caminho desse programa redigido por Washington. Depois de ordenar aos tanques do exército que abrissem fogo contra os manifestantes, em Outubro de 1993, matando centenas e deixando o edifício do Parlamento enegrecido pelas chamas, o cenário foi montado para privatizar os mais preciosos bens do Estado e entregá-los aos chamados oligarcas. E claro... o Banco Mundial estava lá. No frenesi legislativo anti-democrático que se seguiu ao golpe de Ieltsin, Charles Blitzer, economista-chefe do Banco Mundial para a Rússia, disse ao Wall Street Journal: “Nunca me diverti tanto em toda a minha vida”.

Quando Ieltsin deixou o posto, a sua família tinha-se tornado inexplicavelmente rica, enquanto vários dos seus subalternos foram acusados de escândalos de subornos. Esses incidentes foram divulgados no Occidente, como sempre são, como desafortunados adornos locais daquilo que não era mais do que um projecto de modernização económica muito ético. De facto, a corrupção estava incrustada na própria ideia da terapia de choque. A vertiginosa velocidade da mudança era crucial para evitar a rejeição generalizada das reformas, mas isso também implicava que, por definição, não podia haver qualquer controlo. Além disso, os subornos aos funcionários locais eram um incentivo indispensável para que os “apparatchiks” da Rússia pudessem criar a completa abertura do mercado exigida por Washington. A conclusão é que afinal há boas razões para que a corrupção nunca seja a grande prioridade para o Banco Mundial e o FMI: os seus funcionários entendem que quando designam políticos para que levem a cabo uma agenda económica que se sabe lhes granjeará furiosos inimigos em casa, é normal que haja alguma recompensa nas contas bancárias daqueles políticos no exterior.

A Rússia está longe de ser uma excepção. De Augusto Pinochet, que acumulou mais de 125 contas bancárias enquanto construía o primeiro Estado neoliberal, a Carlos Menem, que conduzia um Ferrari Testarossa vermelho enquanto procedia à liquidação do país, passando pelos biliões de dólares “desaparecidos” no Iraque, existe em cada país uma classe de políticos ambiciosos e sacanas, dispostos a actuar como sub-contratantes do Ocidente. Cobram honorários e esses honorários chamam-se corrupção — o silencioso mas omnipresente companheiro na cruzada para privatizar o mundo em vias de desenvolvimento.

As três principais instituições no centro dessa cruzada estão em crise. Não por causa das suas pequenas hipocrisias, mas por causa das grandes. A OMC não vai conseguir endireitar-se. O FMI caminha para a bancarrota, movida pela Venezuela e pela China. E agora o Banco Mundial está a ir ao fundo.

O Financial Times diz que agora quando os administradores do Banco Mundial formulam os seus conselhos, “toda a gente se ri deles”. Talvez devêssemos todos rir do Banco Mundial. O que definitivamente não devemos é participar nesse esforço para limpar a ruinosa história do Banco, repetindo a absurda narrativa de que a reputação de uma organização tão louvável que luta contra a pobreza foi manchada por um único homem. É muito compreensível que o Banco queira atirar Wolfowitz pela borda fora. Mas eu digo: deixem o navio afundar-se juntamente com o comandante.

Naomi Klein 2007, Distributed by The New York Times Syndicate

:: enviado por JAM :: 5/16/2007 12:13:00 da manhã :: 0 comentário(s) início ::

segunda-feira, maio 14, 2007

O inferno é um videojogo

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A valente decisão de Ratzinger — teólogo, no fim de contas — de ratificar a existência real do inferno, pôs termo à larga e nefasta influência de Borges que, em meados do século passado, tinha decretado que a teologia não era mais do que uma forma particular de literatura fantástica. Assim pois, o júbilo dos teólogos redimidos pelo seu ex-colega Bento XVI foi enorme por três motivos bem distintos: Primeiro, era muito diferente trabalhar sem rede, sem inferno, ou com um inferno pertencente a uma mera metáfora da literatura fantástica, e trabalhar com o justiceiro fogo eterno funcionando a todo o gás, em pleno caldeirão do Pedro Botelho. Em segundo lugar, as todo-poderosas ficções fantásticas que tanto fascinam as novas gerações agarradas aos computadores (screenagers) não têm a sua procedência em Borges, Tolkien, Philip Dick, mangas japoneses, Harry Potter, bandas desenhadas de super-heróis, contos de fadas, efeitos especiais e espaciais das produções Lucas, Playstation 2 ou 3, mas antes procedem em linha directa das iconografias e cenografias que os teólogos clássicos tinham idealizado para pintar o inferno. Em terceiro lugar, porque era lógico que, se o Vaticano se tinha especializado na fabricação em série do apocalipse — qual deles mais terrível e devastador — e se o inferno só pertencia (como defendiam Borges e Wojtyla) à mesma categoria literária do inferno de Comala de Rulfo, a cidade das maravilhas de Gabo, o condado de Yoknapatawpha de Faulkner, La Mancha de Cervantes, ou outra qualquer fanta ou meta-ficção, nesse caso faltava algo na narração católica — faltava o final: as tradicionais indústrias justiceiras do castigo, o arrependimento, a salvação e a perdição eternas.

E aqui há duas grandes teorias. Que Bento XVI, influenciado pela muito influente crítica literária que ultimamente tenta demonstrar que os lugares imaginários da nossa melhor literatura não passam de pseudónimos da realidade e que, como tal, o inferno, longe de ser uma metáfora ou um disfarce do realismo teológico, é um lugar exacto que existe e obedece a leis — secção leis físicas, incluindo as quânticas. E a segunda — a minha teoria preferida — é que o actual fervor das massas juvenis pelos videojogos voltou a infundir no globo, tal como na Idade Média, a paixão pelos infernos dantescos e seria ridículo, nessas circunstâncias, que o Vaticano renunciasse à sua tradição.

Não sei que imagens teria Bento XVI na cabeça no momento de reivindicar o inferno — só pode tratar-se de imagens tenebrosas — e condenar a heresia a célebre proposta de Borges, precipitadamente adoptada por Vojtyla, mas aposto que ele terá feito a mesma reflexão que eu fiz perante essa guerra mundial que opõe a PlayStation3, a XBox e a Wii, as quais concebem essas narrativas do futuro aflitivo que nunca mais voltarão a ser nem literárias, nem cinematográficas, nem sequer televisivas. Porque se a juventude actual / global crê a pés juntos nesses infernos dos videojogos que propõem as três consolas multinacionais, quer sejam os abismos de Narnia, os túneis de Tomb Raider, as catacumbas da Final Fantasy, os monstros da Warcraft ou o terrorismo subterrâneo do Urban Caos (para só citar os clássicos), então alguém deveria exercer os direitos de autor sobre o inferno analógico.

Seria estúpido se os teólogos renunciassem agora a esses infernos e apocalipses que eles próprios inventaram um dia, que tanto influíram nas literaturas clássicas, que são a narrativa juvenil favorita do século XXI e que somente tentam reproduzir nos ecrãs domésticos, interactivos e online os meandros do inferno de Dante, só que muito mais tenebrizados, se assim se pode dizer. E uma vez que de momento não existem videojogos sobre o céu ou o limbo — seriam um fracasso comercial — então é lógico que esse grande teólogo clássico que é Ratzinger, na altura em que atacam os modernos videojogos propondo-nos esses remakes do antigo inferno em versão digital e interactiva, se tenha decidido por fim a reivindicar o velho copyright Vaticano.

(Traduzido da Tribuna de Juan Cueto, El País Semanal, 11/05/2007)

:: enviado por JAM :: 5/14/2007 07:58:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

quarta-feira, maio 02, 2007

El triunfo y el miedo

Las revoluciones tienen dos fases, la lucha por la libertad y la lucha por el poder. La primera saca de los hombres lo mejor: el valor, la honestidad y la fraternidad. La segunda lo peor: la envidia, la violencia, la desconfianza y el anhelo de venganza.

Comenzada por las huelgas de agosto de 1980, la revolución de Solidaridad aseguró dieciséis meses de libertad. Terminaron en diciembre de 1981, con la ley marcial del general Jaruzelski. Solidarnosc, perseguida y encarcelada, se refugió en la clandestinidad, resistió y, aprovechando la perestroika soviética, reapareció en 1989. Los comunistas reformadores y la oposición democrática acordaron la transición pacífica y abrieron el camino hacia el desmontaje del régimen totalitario en todo el bloque comunista.

Solidarnosc se basaba en la lucha sin violencia y en el diálogo, en el compromiso, en vez de la revancha, en la idea de la Polonia común y no de la Polonia de los vencedores. Aquella concepción dio el restablecimiento de la democracia parlamentaria, la separación amistosa de la Iglesia del Estado, la construcción del Estado de derecho y de la economía de mercado, el ingreso en la OTAN y la UE y buenas relaciones con los pueblos vecinos y las minorías nacionales. Esos son los triunfos de la nueva Polonia, a la que nunca le faltaron los críticos que no aceptaron el camino trazado por las experiencias de España en la construcción de la democracia.

La Polonia de hoy es distinta. Han bastado dos años para que el Estado haya sido transformado por el poder en un feudo de los partidos que gobiernan. La segunda fase de la revolución, la lucha por el poder, tiene el semblante de los fracasados.

La Junta Directiva de la Universidad de Varsovia -apoyada por otras escuelas- señaló en una resolución reciente: "Somos testigos del tratamiento de las leyes de manera instrumental y de la apropiación de las instituciones públicas por los partidos que gobiernan, de la saturación de las relaciones sociales y económicas con una ideología hostil al diálogo y al compromiso y de la limitación de la libertad de los medios, en particular de los medios públicos. Inquietan la calidad cada vez peor de la legislación y el cuestionamiento de la autoridad de los tribunales, los ataques contra el Tribunal Constitucional, el nombramiento de los funcionarios públicos a dedo, la violación descarada del principio de la presunción de la inocencia, el abuso del arresto provisional, la violación de la dignidad de las personas detenidas y la 'politización' de la fiscalía. Preocupa la tendencia visible a dirigir la vida social con normas represivas".

El proceso que despierta más protestas es la verificación de las biografías, ideada, según el poder, para recuperar la honestidad moral mediante el conocimiento del pasado de los ciudadanos. La ley sobre la verificación de las biografías suscita muchas reservas, porque obliga a la gente honesta a elegir entre el cumplimiento de ley, confesando si colaboró o no con el régimen comunista, o su rechazo.

Desde la caída del comunismo nunca se sintió con tanta fuerza la voz de la comunidad universitaria cuyas protestas siempre anunciaron en Polonia la rebelión de la sociedad, el rechazo firme de la política del poder.

Pero, ¿por qué gobierna hoy en Polonia una coalición integrada por revanchistas que pertenecieron a Solidaridad, aventureros provincianos nacidos del comunismo, chauvinistas, xenófobos y antisemitas y los círculos clericales de la "Radio María"?

Todo gran cambio tiene vencedores y perdedores. El gran cambio polaco dio derechos a los ciudadanos, pero también un aumento de la delincuencia. Surgió una economía de mercado racional, pero provocó un gran paro. Dio vida a la clase media, pero provocó una gran desigualdad entre ricos y pobres. Abrió las fronteras, pero generó el temor ante los extranjeros. Facilitó la entrada de la cultura occidental, pero avivó la xenofobia provinciana y clerical. La religión fue convertida en arma política y en supuesto refugio para quienes pensaban que en el mundo contemporáneo todo es inseguro. La gente era libre, pero había perdido la seguridad de la sociedad carcelaria del comunismo. En aquel régimen el hombre pertenecía al Estado, pero el Estado le garantizaba la seguridad que da la cárcel. En el nuevo mundo, el ex ciudadano del régimen carcelario se sentía abandonado por el Estado. Y en ese clima la retórica de la actual coalición gubernamental, una mezcla del mensaje de Bush con el de Putin, encontró terreno abonado.

Entre los frustrados hay combatientes de la revolución pacífica de Solidaridad que pensaban que la derrota de la dictadura equivaldría a su triunfo personal. No fue así y mucha gente se sintió estafada. Además, los comunistas no fueron castigados y los activistas de Solidaridad no fueron premiados. Muchos se sintieron rechazados y ese sentimiento generó odio, rencor y deseo de venganza.

Los fracasados no reconocieron que la libertad era la mayor conquista de Polonia. Para ellos la Polonia libre era un Ubekistán (UB, las siglas de la policía política comunista), un Estado gobernado por los agentes del antiguo aparato de seguridad. Polonia necesitaba una profunda Revolución Moral. Había que castigar el mal, premiar el bien y nivelar las injusticias y en las elecciones del 2005 triunfaron los partidos de los fracasados. Los unió el populismo y el ansia de revancha.

El primer objetivo fue eliminar de la administración pública a quienes sirvieron a la Polonia de la libertad. El Parlamento aprobó una ley sobre la verificación de las biografías que afecta a 700.000 ciudadanos. Los gobernantes prometieron que Polonia recuperaría así la dignidad y la moral, sólo que la verificación de tanta gente requerirá por lo menos 17 años y eso significa que durante ese tiempo muchos ciudadanos no podrán dormir ante el miedo a ser acusados de que fueron confidentes de la dictadura, porque así lo dicen los documentos de la policía comunista que son la única fuente de información en la que se basa la verificación.

La ley prevé la publicación de la lista de todas las personas que figuran en los informes de los servicios secretos, juntas las víctimas y sus perseguidores. El que se sienta perjudicado, podrá buscar la justicia en los tribunales. El acervo personal no servirá ya para valorar al ciudadano, porque el Estado dará más crédito a los informes de sus enemigos, los agentes de la dictadura. ¡Dulce venganza de la policía comunista!

Los ciudadanos deberán confesar si fueron o no confidentes, bajo la amenaza de perder el trabajo y ser despojados del derecho a ejercer su profesión durante 10 años. Esa obligación afecta a más de cincuenta profesiones, entre ellas a los científicos y periodistas que se han rebelado. Muchos han anunciado que no presentarán la confesión exigida y Ghandi ha vuelto a ser héroe de la desobediencia ciudadana.

Muchos preguntan si no se debió hacer la verificación de las biografías en los comienzos de la democracia y yo les recuerdo que el objetivo de la revolución pacífica polaca eran la libertad y la soberanía pero no la caza de brujas, y que gracias a ello entramos en la OTAN y en la UE, donde no hay sitio para los Estados en los que imperan el miedo y la desconfianza. Pisotean los ideales de Solidaridad.

Adam Michnik es escritor polaco. Traducción de Jorge Ruiz Lardizabal.

:: enviado por JAM :: 5/02/2007 10:46:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::